segunda-feira, 3 de agosto de 2015

A Vida é Quente

 
Às vezes a vida parece entediante, morna e muito mais cinza do que a própria cidade onde você enterra os seus sonhos.

O tempo é o seu maior inimigo: passa depressa demais quando você é pressionado pelo chefe e um bocado devagar quando você quer voltar para casa. O relógio é traiçoeiro: parece parar quando você está de olho, mas dispara abruptamente quando você decide viver sem contar os minutos.

Um apanhado de "tic tacs" que constrói um caminho longo e árduo, cujo início parece recente mas já não aparece quando olhamos para trás. E mesmo cheio de curvas, esse caminho não causa emoção. É composto por migalhas e palavras não ditas. Por neblina e nevoeiro. Por tropeços e trapaças. Por portas trancadas e janelas blindadas. Por desvios e contramão. Por trajetos mal acabados e viagens interrompidas.

Mas a vida é tão doce que até nos surpreende. Quando você está cansado de cair sempre nos mesmos buracos, vem alguém e te puxa para cima. E então você enxerga aquelas cores que sumiram depois da adolescência. Você olha para os próprios braços e vê seus pelos levantados, mas não sabe se é frio ou arrepio. Creio que seja a segunda opção, já que a pele dos mesmos braços está quente como o fogo.

E essa ardência que te move é a mesma que te cega. Te afasta do abismo e te leva ao precipício. Te mostra a beleza da vida e te entrega o peso do mundo. Mas é justamente essa ardência que te lança o maior dos desafios: sair do morno. O morno não esfria nem esquenta, não gela nem congela, não escalda nem incendeia, não queima nem bronzeia. O morno te tira o tato. O morno não tem formato. O morno é um chato.

Então vai, se joga na fogueira e espera a sua luz brilhar. Aumenta a temperatura e deixa o seu corpo abrasar. Quem gosta de adrenalina sabe atear fogo sem se inflamar. Não se inflama e não se engana, mas ama um drama que o tire da cama. Afinal, a cama é pequena demais para abrigar os nossos sonhos e morna demais para apagar o nosso fogo.

Foto: o fogo do bem.