terça-feira, 16 de dezembro de 2014
Trouxa, eu?
Metas para 2015:
- Deixar de ser trouxa;
- Parar de ser trouxa;
- Não ser mais trouxa.
Vi essa checklist - bastante conveniente, diga-se de passagem - no Instagram da Nazaré Amarga, a mesma Nazaré Tedesco que me divertia semanalmente em "Senhora do Destino". Sim, aquela que jogava pessoas da escada e zoava a Leandra Leal, que tinha um piercing na sobrancelha e era meio esquisita. Até aí, eu tenho dois piercings no nariz e um transversal na orelha direita, então devo ser igualmente zoada por outras pessoas. Mas furos no corpo não tornam alguém esquisito, tampouco trouxa. Falando em furos, ainda vejo a celulite que jurei eliminar em 2014. Pois é, tudo indica que essa meta se estenderá por mais um ano.
Mas celulite também não me faz trouxa. Nem a cicatriz que eu tenho no cotovelo, nem minhas pontas duplas, nem minha mania de estragar a dieta com Bis Xtra (sim, aquela barra gigante sabor Bis, mas muito melhor do que Bis). Cada um desses deslizes me faz humana e minimamente suportável, afinal de contas, meu lado trouxa julga insuportável quem não tem celulite, cicatriz ou desejo por chocolate.
Meu lado trouxa é interno, oculto e sombrio. Por fora, sou como muitas garotas jovens e independentes que pouco se importam com aquele otário. Por dentro também. Mas como toda trouxa, me dou o direito de lamentar minha vida amorosa, mesmo tendo outros problemas realmente lamentáveis. Como muitos trouxas que conheço, me acabo na academia para devorar um pão de queijo recheado, espero ansiosamente por uma resposta xis no WhatsApp, gasto dinheiro com o que não preciso, me interesso por pessoas tão trouxas quanto eu.
Como muitos trouxas por aí, às vezes falo da vida alheia só para saber o quão diferentes as pessoas são. Não raramente, os boatos que surgem nas rodas me dão a impressão de que Fulano é isso ou aquilo e eu crio sua imagem à minha maneira. Mas enxergar o outro com histórias tão superficiais me parece injusto e leviano, o que faz de mim uma pessoa ainda mais... trouxa.
É por isso que a Nazaré Amarga tem razão: deixar de ser trouxa deve ser meta para 2015. De fato, essa característica universal descreve os mais variados tipos de gente. Apaixonados, viciados, rejeitados, desocupados, deslumbrados: todos trouxas! Mas como não ser nada disso em 365 dias?
Enquanto eu não tiver a fórmula mágica, vou me esforçando para dar o melhor de mim no próximo ano, mesmo que o meu melhor seja insuficiente para os outros trouxas que também dão o seu melhor, que para mim é insuficiente. Mas já que esse assunto está ficando confuso, vou parar por aqui. Se, inevitavelmente, formos um bando de trouxas no ano que vem, paciência. A ideia é aceitarmos uns aos outros e, em primeiro lugar, aceitarmos nós mesmos.
Como dizem por aí, "estou fazendo origami com meu papel de trouxa". Talvez seja essa a tal fórmula mágica, mas se não for, deixa que a vida ensina.
Foto: Roberto G. Bolaños, eterno Chaves (o garotinho trouxa que morava na vila).
terça-feira, 28 de outubro de 2014
Garotas e Seus Parafusos
Garotas são assim:
Choram durante a primavera, quando os resquícios de luz lhes fazem companhia na volta para casa. Odeiam o sol nos dias em que não podem aproveitá-lo. Do contrário, amam-no incondicionalmente. Garotas gritam, esperneiam e se machucam com o simples ato de pensar. Se apaixonam, se apegam e se desencantam com a mesma intensidade. Elas ainda sonham com príncipes, cavalos brancos e trilhas sonoras, mesmo que o único elemento real seja o terrível alarme do seu despertador. Não suportam linhas tortas de delineador, sapatos apertados e cinema sem pipoca. Gostam de mensagens inesperadas, encontros inusitados e viagens imprevisíveis. Adoram motoboys educados (e não xavequeiros), brigadeiros de panela (na panela) e cartinhas amarrotadas em gavetas intocáveis. Elas adiam o inadiável, recusam o irrecusável. Elas julgam o comportamento masculino, embora condenem o delas próprias. Elas se emocionam sem ver "Titanic" pela milésima vez, um Coldplay dentro do carro já é suficiente. Elas sabem comer como trogloditas. Elas perdem as estribeiras. Elas se esquivam, se escondem e recuam. Elas se atrevem, se arriscam e ousam. Finalmente, elas se arrependem.
Garotas são meninas-mulheres complexas demais para quem não faz parte dessa tribo, por isso se interessam por aqueles que têm a incrível capacidade de ler seus pensamentos. Basta acertar na música, no chocolate ou no elogio. Se, ainda assim, elas não se derem por satisfeitas, faz parte. Nem sempre é TPM, às vezes é saudade, depressão pós-nada, pé na bunda, ressaca ou carência. Repito: garotas são muito complexas. Mas se não fossem, que graça teriam?
quinta-feira, 2 de outubro de 2014
Desabafo de uma Quietinha
As pessoas costumam me perguntar por que sou tão quieta em algumas ocasiões. Na maioria das vezes, percebo que elas julgam "quieta" uma característica negativa, própria de quem não se relaciona normalmente com os falantes, comunicativos, expansivos e extrovertidos.
De fato, há uma linha tênue entre ser quieto e antissocial. Mesmo sendo legal, quem fala quase nada pode se "autoexcluir" dos grupos que jogam conversa fora na mesa do boteco ou falam da vida alheia na sala do escritório, hábitos indispensáveis para a política da boa vizinhança.
Quem pouco fala é considerado esquisito, alienado, "sem opinião" e, segundo o dicionário, virgem (?). Quem pouco fala nunca é visto como um grande líder ou figura popular. Quem pouco fala tem mais chances de ser o nerd da turma. Quem pouco fala nunca se destaca em multidões histéricas e ativistas de plantão. Quem pouco fala pouco será ouvido.
Desta forma, ser quieta me parece uma grande desvantagem. Eu certamente seria mais realizada se tivesse voz, confiança, ousadia e coragem ao invés de timidez, pudor, receio, vergonha e preguiça. Esta última, principalmente, vem me atrapalhando bastante nos últimos anos.
Discursos extensos, diálogos complexos e fofoqueiros maliciosos me dão certo "bode", aquela sensação de tédio que temos às segundas-feiras. Ok, o certo é me envolver em conversas alheias e buscar o meu "espaço" no grupo, assim como fazemos em primeiros dias de aula. A pauta da discussão não importa, mas os comentários que a gente faz.
Eu juro que me esforcei para opinar sobre a tecnologia inserida no novo Nintendo Super Smach Bros, a polêmica que envolve a "não-gata" Hello Kitty, a pausa na carreira do cantor Belo e o cabelo esquisito daquela Fulana "xis".
Sinceramente, não me saí bem. Minha tentativa de discorrer sobre esses e outros assuntos igualmente apáticos foi um fiasco, então parei de me envolver. Logo me calei e voltei ao meu posto de quieta, quase muda, observadora e "estranha da turma". Enquanto isso, faladores e tagarelas desenvolveram seus monólogos, mesmo que os ouvintes estivessem visivelmente fatigados.
Embora nos atrapalhe em muitos aspectos, a quietude pode ser nossa grande aliada. Fale pouco e se comprometa menos. Discuta menos. Se enrole menos. Ouça mais. De fato, "quem tem boca vai à Roma", mas quem não tem pode ir muito além. Na dúvida, prefira o equilíbrio.
De um jeito ou de outro, deixo bem claro que não sou estranha, apenas tímida e um pouco preguiçosa. Prefiro ouvir piadas, falar sobre Disney e suas princesas, contar os babados do último sábado, discutir bons livros e comentar a beleza do Bruno Gagliasso em "Dupla Identidade". Meu papo não é melhor nem pior, tem apenas outra pauta. Se não te der sono, fale comigo!
Quanto àqueles que reclamam do silêncio alheio, sugiro pensarem se falam demais. Às vezes, o excesso de palavras pode inibir a resposta do interlocutor. Isso não é agradável, tampouco saudável. Isso é chato, irritante e egoísta. Já dizia o Kiko, "cale-se que você me deixa louco".
E quando percebo que um porta-voz quer ofuscar o brilho dos quietinhos, dá logo uma vontade (rara) de abrir a boca para reproduzir apenas uma frase: "¿Por qué no te callas?".
terça-feira, 16 de setembro de 2014
Vou Ser Gentil e Já Volto
Admiro os inteligentes, me divirto com os engraçados. Os românticos, então, me fascinam. Invejo os autoconfiantes, me interesso pelos discretos e aprecio os elegantes. Mas entre tantas características que definem o ser humano, aquela que mais valorizo é a gentileza.
Pessoas gentis sabem me cativar, mesmo desprovidas de intelecto ou bom humor. Se o cara abre a porta do carro, ponto para ele, pode até estar com uma camisa esquisita que eu nem vou me importar. Se o cara não abre a porta do carro, sem problemas, mas a camisa esquisita vai se destacar.
Pequenas atitudes são admiráveis e igualmente afrodisíacas. Acreditem: o cara lindo fica ainda mais lindo quando diz "eu te busco em casa" ou te empresta o casaco de moletom em dia de frio.
Mas gentileza não significa cavalheirismo, pois pode - e deve - ser praticada por ambos os sexos. Ainda me lembro do dia em que parei no ponto de ônibus e começou a chover. Antes que eu pudesse me molhar, a senhora que estava ao meu lado abriu seu guarda-chuva e disse:
- Aqui é como coração de mãe: sempre cabe mais um.
Então eu sorri e agradeci, ao mesmo tempo em que observei os motoristas dos carros discutirem entre si. E mesmo sem o conforto do seu próprio veículo, há pessoas altruístas que muito se familiarizam com a gentileza. Da mesma forma que a senhorinha me acolheu em seu guarda-chuva, uma garota com seus vinte e poucos anos completou o dinheiro da minha passagem de ônibus quando deixei o bilhete em casa. As coisas seriam mais fáceis se eu não fosse tão avoada, mas seriam ainda mais difíceis se eu não conhecesse essas pessoas.
Gentileza não é fazer declarações de amor, convidar para jantar ou distribuir elogios. Gentileza é algo muito mais sutil, que faz alguém se destacar dos demais por um simples gesto. Gentileza é o que fez comigo o senhorzinho da praia. Em um dia quente de verão, fui encher minha garrafinha d'água embaixo do chuveiro. Quando menos percebi, ele foi em minha direção, dobrou seu braço esquerdo e deixou que a água gelada escorresse do cotovelo para o bico da garrafa, enchendo toda a embalagem. Antes mesmo que eu pudesse agradecê-lo, ele virou as costas e foi embora.
Gentileza é uma amabilidade espontânea e voluntária que muitos carregam consigo sem ao menos perceber. É o carinho desprogramado de quem não força uma situação. É o comportamento natural de quem sabe ceder o lugar às pessoas mais velhas ou dar docinhos fora de época.
Gentileza é um lado mais humano que nos surpreende. É um gesto solidário que vai além do óbvio. É uma pitada de meiguice em quem parece normal.
Claro, nem todo mundo sabe ser gentil, mas todo mundo adora quem é. Aqueles que praticam gentileza são unanimemente (leia essa palavra sem tropeçar) queridos e dignos de nossa admiração. E para quem deseja ser tratado com gentileza pelas pessoas que o cercam, basta tratá-las da mesma forma. Como ouve-se falar por aí, "gentileza gera gentileza".
Às vezes perdemos a "compostura" e não somos tão gentis, mas isso é algo que podemos melhorar nas situações mais banais do dia a dia. Sorria para o motorista ao lado, abra a porta do elevador, mande um WhatsApp perguntando se o outro chegou bem em casa. Se não quiser, observe quem o faz. Você certamente mudará de ideia.
Gentileza não custa e não dói. Gentileza é o puro exercício de ser cortês sem esperar nada em troca. Gentileza vem de casa e se pratica na rua. Gentileza deixa o ruim bom e o bom melhor ainda. Gentileza sem amor é bom. Amor sem gentileza é ruim.
E depois de tanta reflexão, me despeço com uma simples mensagem:
"All we need is kindness".
segunda-feira, 21 de julho de 2014
A Arte de Escrever
Anos 90: o tempo em que bexigas gordas com cara de palhaço escondiam balas e pirulitos; o tempo em que Shopping Eldorado era sinônimo de Parque da Mônica, não Bodytech; o tempo em que dançarina do É o Tchan não era periguete; o tempo em que números de telefone tinham sete dígitos.
Ah, os anos 90! Entre tantas mudanças e avanços tecnológicos, sinto falta da caneta. Aquela que a gente usava para escrever cartas endereçadas aos amigos, com direito à foto revelada, marca de batom no papel estampado, CEP, selo e caixinha do correio. Aquela que a gente usava para trocar bilhetinho na sala de aula. Aquela que a gente usava para julgar a letra do outro e melhorar a nossa própria.
Canetas coloridas com cheirinho de fruta, onde estão vocês? Ainda posso sentir o aroma de tutti frutti da minha Signo rosa, a mesma que eu usava para escrever o título da redação.
Canetas coloridas que decoravam o estojo, onde estão vocês? Ainda me lembro de quando colocava uma a uma nos elásticos da Kipling, da mais clara para a mais escura.
Canetas tinteiro que borravam a folha, canetas BIC quatro cores, canetas com "pom pom" na ponta: sempre tão úteis para escrever no diário, anotar o número do colega ou desenhar na carteira da escola.
Saudades dos manuscritos e das obras de arte produzidas por cada uma delas, sem qualquer interferência da tecnologia. Afinal de contas, não há teclado que substitua a personalidade das letras humanas, cujas imperfeições revelam o escritor oculto e seu estado de espírito.
Talvez seja esse pequeno objeto o grande responsável pela minha paixão em escrever. Se tenho uma boa ideia, pego a caneta jogada em algum canto da bolsa e anoto no bloquinho. Se o professor passa matéria, dispenso o laptop e escrevo no caderno. Amo curvas, rabiscos e letras legíveis. Amo cadernos Tilibra, linhas e margens. Amo, principalmente, a boa e velha escrita: uma eterna descoberta que ilustra meus devaneios.
sexta-feira, 20 de junho de 2014
Saudade
Saudade de acordar em plena madrugada com o som da sua TV, ou de ir pra escola com o barulho do seu rádio. Como ouvir a música matinal da Jovem Pan sem pensar em você? Como despertar todos os dias sem pensar em você?
Saudade do seu discurso otimista ao terminar o domingo. "Boa semana, força, vai com tudo!". Ei, você podia voltar só pra falar isso de novo? Eu odeio encerrar a semana e encarar a que está por vir. Talvez porque você não esteja mais aqui.
Saudade de colocar meu dedão do lado do seu e ficar impressionada com tamanha semelhança. Eu nunca achei meu olho ou nariz parecido com o seu, tampouco minha boca. Mas meu dedão (da mão E do pé)... meu Deus! Esse era igual.
Saudade de ouvir sua opinião sobre a escola e os meninos. Me lembro bem do dia em que eu completei 14 anos, você me chamou pra conversar e disse: "Agora você pode beijar na boca". Como boa menina que ouve o papai, dei meu primeiro beijo 20 dias depois.
Saudade de quando você ia me buscar na terapeuta, porque no meio do caminho a gente ouvia Tim Maia e parava na esquina pra comer milho. O percurso da escola pra casa também era legal. A gente sempre parava no Rancho da Empada.
Saudade dos três toques de campainha que você dava antes de entrar em casa, e do tempo em que a trilha do SPTV não me irritava. Saudade do jantar na mesa e do modo como você tomava o seu remédio depois da refeição. Saudade do "para de estudar e vem ficar comigo", ou do "sai do computador e vem ver TV na sala". Se fosse hoje, eu largaria até o meu trabalho pra assistir noticiário.
Saudade de quando você me acordava com uma massagem nas costas. Eu não sabia se ficava brava por ter sido acordada ou feliz pela massagem. Hoje, ficaria feliz.
Saudade do SMS diário, do abraço apertado, das flores no aniversário e do seu simples interesse em saber como foi meu dia. Ah, pai, volta só pra eu te contar as novidades! Paramos no dia em que eu deveria embarcar pra Porto Seguro (o mesmo dia em que você se foi, por sinal). Depois vem a minha formatura do colegial, meu vestibular, minha faculdade, meu primeiro emprego, minha formatura da faculdade, minha demissão e meu retorno ao mercado de trabalho. Também tem a parte que eu conheci a Europa (e vi a Torre Eiffel!!!!!!!), paguei meu curso de teatro, fiz uma tatuagem em sua homenagem e emagreci 11 quilos cortando todas as gordices que a gente amava! A parte que eu bebi demais e fiz alguma besteira você não precisa saber, né?
Saudade de você na minha vida, me ajudando a decidir o que era certo e errado. Como hoje eu não posso contar com a sua valiosa opinião, sigo sempre os seus conselhos: "Faça uma lista de prós e contras", "Se você tiver alguma dúvida de que isso é errado, não faça", "Se deu, bem, não deu, amém". Tá, confesso que, às vezes, eu escolho a opção que tem mais contras, faço aquilo que não acho tããão certo e não digo "amém" pro que deu errado. Mas ninguém é perfeito!
Saudade do tempo em que eu encostava a cabeça no travesseiro sem pensar demais em você.
Saudade dos dias em que ter um pai era normal.
Saudade de dizer "te amo" e ouvir "te adoro" em troca, mesmo sabendo que o seu "te adoro" era o "te amo" mais sincero do que qualquer outro "te amo".
Saudade, enfim, do tempo em que eu não sentia saudade.
Foto: seu penúltimo Réveillon.
terça-feira, 8 de abril de 2014
A Terra da Garoa
Minha São Paulo é contraditória. Uma cidade onde o caos das filas e multidões me faz odiá-la com certa frequência, enquanto a vida alheia me encanta a cada esquina. Quando o cansaço vem, uma conversa ao telefone me faz relaxar. Talvez seja a voz serena daquele homem ou, simplesmente, a frase que ele diz: “a gente vai se recuperando”. Então o estresse pós-lotação do metrô não mais me incomoda, afinal de contas, milhares de paulistanos – assim como eu – precisam se sacrificar para chegar a algum lugar (literalmente). E nesse processo de recuperação, as pessoas esperam ansiosas pela última parada.
Minha São Paulo é contraditória.
O barulho do trem quase me ensurdece, mas o diálogo entre pai e filha é música
para os meus ouvidos. A playlist do
iPod me cansa, mas o som daquele japa que eu ouvi no Trianon é simplesmente
genial. Os passarinhos se esconderam entre os edifícios da Paulista, mas a
nossa gente talentosa sabe cantar por eles.
Minha São Paulo é contraditória.
Eu odeio o busão às seis da manhã, mas amo o Starbucks às seis da tarde.
Apaixonados, engravatados e mal-humorados nem parecem paulistanos quando se sentam
naquele sofá e descansam com um copo na mão. É aí que eu penso: como ainda
arranjam tempo para o café da tarde? Talvez tenham escapado do trabalho ou
faculdade, encerrado o expediente, largado qualquer compromisso menos
importante para tomar um Frappuccino com o(a) namorado(a), desistido da dieta –
em plena terça-feira – para experimentar um Caramelo Macchiato ou, assim como
eu, entrado para esperar a aula começar.
Mas mesmo do lado de dentro, no
sossego da cafeteria, os minutos passam depressa. Quando volto a
observar cada um que se senta próximo a mim, já é hora de levantar. E a São
Paulo agitada me espera lá fora. Tão igual, tão comum e tão contraditória.
Foto: Starbucks, café e calmaria.
quarta-feira, 5 de março de 2014
Carnaval e Seus Amores
Se eu não sou por mim, então quem é por mim?
Se eu sou só por mim, então quem sou eu?
E se não agora, então quando?
Essa passagem pertence ao koan judaico, questão com aspectos inacessíveis à razão. Em outras palavras, o termo se resume em "um dilema, um mistério que a mente racional não tem capacidade para resolver. Frustrando e contrariando nossas estratégias habituais de obter respostas, conhecer e compreender, ele nos leva a começar de novo. A chave para a resolução de um koan é uma mudança no ser do estudioso que permite um novo entendimento da própria questão". Tal explicação foi retirada do livro "Histórias que Curam - Conversas Sábias ao Pé do Fogão", da médica Rachel Naomi Remen.
Confesso que tentei encontrar algumas respostas para esse koan, mas falhei. Elas são, de fato, um verdadeiro mistério. Acredito que todas as questões mais complexas e abstratas, que fogem da nossa razão, só são desvendadas depois de muito tempo, quando somos mais velhos e experientes.
Para ser bem sincera, talvez as pessoas nunca cheguem a uma conclusão. "Quem sou eu?" é uma pergunta um tanto quanto ousada, cujas respostas podem variar de acordo com a época, o status, a vida profissional, pessoal e financeira e, principalmente, o estado de espírito em que elas se encontram. Só sei que, no final das contas, o que importa mesmo é dar o nosso melhor durante a vida toda e responder, sem culpa nenhuma, aquilo que papai um dia me disse: "Tenho 50 anos muito bem vividos".
E para viver bem, basta atender algumas de nossas vontades. Na última segunda-feira, eu estava em uma festa de carnaval e encontrei um casal de idosos bastante animado. No meio da pista de dança, aquele senhor grisalho dançava sem parar, puxando sua companheira para si. Felizmente, aqueles dois velhinhos com alma de jovens se aproximaram de nós, dando início a uma conversa, digamos... enriquecedora.
Ele, Victor Meirelles (fez questão de ser chamado pelo sobrenome), confirmou o que eu já sabia: com 77 anos, tem cabeça de 15. Porém, o que mais me surpreendeu foi o tempo em que ele e Marina estão juntos. Se você, assim como eu, pensou que a relação já dura há 50 anos, está enganado. O casal Energia se conhece há apenas dois anos e, aparentemente, vive o melhor momento de sua vida! Segundo Victor, Marina é um "monumento", uma "gostosura". E foi aí que eu me perguntei: existe idade certa para se apaixonar? Ou melhor, existe idade certa para viajar, trabalhar ou fazer tudo aquilo que você sempre quis?
Depois dessa experiência na festinha de carnaval, percebi que nunca é tarde para tentar e buscar o novo. Eu, por exemplo, passei o colegial inteiro dizendo que ia fazer Pedagogia. Uma semana antes do vestibular, decidi prestar Editoração (?), mudei de ideia e fiz Rádio e TV. Me formei, mudei de ideia mais uma vez e me inscrevi para o curso de Teatro. Adorei, mas continuava sem rumo, contatos e dinheiro. Mais perdida do que cego em tiroteio, decidi fazer pós em Jornalismo. Finalmente, uma boa notícia: estou me encontrando.
Somos capazes de mudar até pequenas coisas do dia a dia. Ontem, por exemplo, mamãe, Bia e eu decidimos almoçar em um restaurante mais caro, onde não frequentamos muito. A conta, claro, veio salgada. Mas não é que aquela tarde atípica com a minha família me deixou leve e feliz? Não sei se foi o frango ao molho barbecue, o risoto de champignon, a companhia ou tudo junto. Só sei que valeu cada centavo. Ao sairmos de lá, mamãe ainda disse: "Nós merecemos". Sim, merecemos.
Depois de tudo isso, o fim do carnaval não me deixou triste. Quem sabe essa quarta-feira de cinzas marque o início de uma nova e boa fase da vida e nos mostre o que/quem realmente merece atenção. Na busca constante pelo novo, é carnaval o ano todo.
Foto: Victor Meirelles e Marina, carnaval de 2014.
domingo, 26 de janeiro de 2014
Smile
As pessoas têm que ser inteiras, não pela metade. Foi o que disse a professora Rita, de Ensino Religioso, quando me chamou para conversar ao final da aula.
Desde então, passei a refletir no que ela me dissera, mas não fiz nada para mudar minha condição de "meia" Renata. Na verdade, acho que o ser humano passa a vida toda em busca da integridade, sempre com a certeza de que lhe falta algo para ser completo.
Tudo bem, existem certas pessoas que, aparentemente, são perfeitas aos trinta e poucos anos e não precisam de mais nada. A Izabel Goulart, por exemplo. Linda, magra, rica, bem-sucedida, respeitada, popular, conhecedora dos seis continentes e dona de um armário impecável.
Mas eu não a conheço de verdade. Talvez ela chore de saudades da família em um quarto de hotel. Talvez ela sofra ao deixar sua casinha do interior para encarar os holofotes da China. Talvez ela odeie viajar de avião, mesmo que o faça dez vezes por semana. Talvez ela não consiga arrumar um namorado porque nunca está no mesmo lugar.
Medos e inseguranças existem para todos, por isso a dificuldade de encontrar a nossa outra metade. Mas acho que a graça da vida está justamente nessa descoberta: o que te faz feliz, completo e realizado? Se responder fosse fácil, eu não frequentaria sessões de terapia.
Me lembro de quando ganhei uma rosa vermelha e ouvi o porquê da cor: "você é uma pessoa muito intensa". Até hoje não entendi se isso foi uma crítica ou elogio. De qualquer forma, a flor era linda.
E em busca desses 100%, nós damos o nosso melhor. Eu não tenho o emprego dos sonhos, mas consegui um freela bacana para o próximo mês. A Izabel G. pouco vê a avó, mas pôde visitá-la no último Natal. Tem dias em que nem isso acontece. O freela termina e eu me desespero. O Natal finalmente chega e a modelo não participa da ceia.
De um jeito ou de outro, tentamos afastar a dor para bem longe e nos convencer de que a vida é muito melhor do que parece ser. Afinal de contas, Djavan já dizia: "Sorri / Vai mentindo a tua dor / E ao notar que tu sorris / Todo mundo ira supor / Que és feliz"
Smile.
Foto: Izabel Goulart com sua avó, D. Rosa, no Natal de 2013.
quarta-feira, 8 de janeiro de 2014
2014: otimismo, praia e mate com limão.
Negatividade: eis um sentimento ruim que, ultimamente, move minhas ideias com certa frequência e intensidade.
De uns tempos pra cá, tive a certeza de que uma nuvem negra se instalou sobre mim e decidiu permanecer por tempo indeterminado. Problemas pessoais e profissionais surgiram tão rapidamente que a minha cabeça deu um nó. Até sofrer ficou difícil, porque eu não sabia nem por onde começar. "Ei, Renatinha, o que vamos lamentar primeiro?".
Sem achar uma resposta pra essa pergunta, eu sofria por tudo junto, ou por nada. Sofria por uma razão desconhecida, cuja origem eu mal sabia explicar. Sofria pelo excesso de trabalho e pela falta dele. Sofria pelo vazio que papai deixara e pela tão esperada viagem que ele não chegou a fazer com mamãe. Sofria pelas decepções de um casamento e pelo fato de não poder dormir dentro da minha própria casa. Sofria pela minha irmã no busão em dia de chuva. Sofria por trancar o curso de Teatro, começar uma dieta e chamar o técnico da NET pra consertar minha TV.
Sofria pela minha sobrancelha rebelde, pela rede Wi-Fi que não funcionava, pelo mau humor diário e pela letra que saía um garrancho. Sofria com fotos antigas, banhos gelados e maquiagem borrada.
Sofria pelo simples prazer de sofrer.
Depois disso, fui me cuidar. Dei um jeitinho na deprê e me tornei uma pessoa mais serena, ou menos irritada. Mesmo assim, ainda é difícil ignorar aquilo que, de fato, está mal resolvido. Certas coisas continuam fora do lugar, independentemente do pessimismo ou do modo como você as vê.
Mas aí eu vou pro Rio de Janeiro e conheço um homem. Ah, como eu queria saber seu nome. Logo no primeiro dia do ano, ele surge em Ipanema e afasta a minha negatividade como ninguém.
No calor de 40 graus, a temperatura da areia faz queimar os pés dos banhistas, que se protegem embaixo de seus guarda-sóis. Porém, esse homem que encontro não pode fazer o mesmo. Vendedor de praia, ele é obrigado a andar com dois enormes galões, um com mate e outro com limão, ambos carregados nos ombros. Proibido de usar chinelo (o calçado joga areia nas pessoas), ele anda descalço na areia borbulhante. Seu suor me apavora.
Então eu o chamo e peço uma bebida. O homem me serve com muita atenção e, desesperado, corre para o meu guarda-sol, batendo os pés como se algum bicho estivesse lhe atacando. Ele pede desculpas e se justifica: "A areia tá quente demais". Aquela cena desperta em mim um sentimento de compaixão nunca sentido antes. Então peço pra que ele se sente e espere o cansaço físico dar uma trégua. Enquanto isso, encho uma garrafa com água para ajudá-lo a se refrescar. O vendedor aceita, descansa e conta que começou a trabalhar na praia há dois meses, quando largou a obra. Depois de perguntar qual dos trabalhos ele prefere, vem a resposta: "Os dois são muito complicados".
Eu nunca me senti tão egoísta.
Depois desse episódio, paro e penso se vale a pena sofrer por tão pouco. Às vezes não tenho controle sobre minhas emoções e a dor vem naturalmente. Como diz minha terapeuta: "Parece que você põe óculos escuros e enxerga tudo cinza".
Nessas horas, vou me lembrar do homem guerreiro que conheci e encarar o problema de frente, sem muito drama e desgraça. Afinal, todos nós passamos por dificuldades no meio do caminho, e a única saída é enfrentá-las.
Já ouvi falar que, se formos otimistas, os problemas logo desaparecem, mas confesso que não boto muita fé. Como eu disse, sou um tanto quanto pessimista. Ih, já sei o que mudar em 2014!
Da próxima vez que o cara da NET vier, vou tratá-lo como um velho conhecido e oferecer AQUELE chocolate, o mesmo que eu vou saborear lentamente, sem o menor pingo de culpa.
Foto: vendedor de mate na praia. Não é o citado no texto, mas gosto de imaginá-lo assim, feliz.
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